terça-feira, 29 de novembro de 2011

O SABOR DA MORTE (Parte 10)


Fiquei tão irritada com aquela invasão à minha casa àquela hora tão imprópria, que no outro dia, a primeira coisa que fiz quando cheguei ao Hospital foi procurar pelo Ronaldo e contar-lhe sobre a visitinha inesperada da sua namorada rica.
- O quê? A Daniela foi à tua casa? Depois da meia-noite? Eu tinha acabado de estar na casa dela, estou confuso.
A sua expressão não o denunciara, ele parecia mesmo surpreendido com isso, no entanto, eu chegara a um ponto em que estava desconfiada de toda a gente. O Pedro mentira-me no outro dia, a namorada do Ronaldo tinha feito um aviso totalmente inesperado, a trama estava a adensar-se.
- Sim, ela esteve lá e sinceramente acho que me fez uma ameaça, disse que sabe que tenho falado contigo, mas que isso não é o principal mas sim as conversas que temos tido, que era para eu ter cuidado, que não sabia dos problemas que poderia vir a ter.
- Ela não mencionou nenhuma vez que te conhecia, muito menos que iria ter contigo. De qualquer forma, andamos um pouco distantes ultimamente, a minha profissão incomoda-lhe no que toca a tempo, ou melhor, à falta de tempo.
Ficamos os dois a olhar um para o outro, aquela química estava cada vez mais forte, mais intensa, muito mais visível para ambos. Estava, no entanto, totalmente fora de questão qualquer envolvimento e ainda mais agora, em que a Daniela estava a mostrar a sua posição.

© Alexandra Carvalho


domingo, 27 de novembro de 2011

Tu


Dei comigo a pensar em ti,
Tal adolescente ansiosa,
Desejei as tuas palavras e a tua atenção.
Dei comigo a sorrir sozinha,
A pensar no impensável,
A desejar o indesejável…
Vou deixar-me ficar assim,
O sorriso voltou,
Permitir-me-ei ficar com ele.


sexta-feira, 25 de novembro de 2011

O SABOR DA MORTE (Parte 9)


Daniela era conhecida de facto, mas nunca tive interesse em ver revistas cor-de-rosa, nem entrevistas superficiais, então, a cara dela passou-me sempre ao lado. Sabia que era muito fútil, estudou Direito, por obrigação, não tinha o menor interesse em algum dia vir a exercer, movimentava-se muito bem entre todos os círculos sociais, frequentava todo o tipo de eventos, bem, pelo menos aqueles que ela considerava dignos da sua presença.
Era uma mulher muito bonita, esbelta, elegante, tinha uns longos cabelos negros, olhos igualmente negros que contrastavam com a sua cor de pele branca, usava franja, desde pequena mantinha esse detalhe, o que lhe dava um ar diferente, de menina adulta.
A verdade é que quando ela se apresentou, o chão desabou, fiquei atónita, completamente sem reacção, mas o que é que esta mulher veio fazer a uma hora tão tardia ao meu apartamento, aliás, como é que ela sabe onde eu vivo?
- Muito bem, é a filha do jornalista. Mas o que eu não estou a entender é a sua visita. Um bocado fora de contexto, direi.
- Talvez numa primeira análise, mas depois de eu falar o que tenho para falar consigo, as dúvidas certamente se dissiparão.
- Se é para falar novamente da autópsia, digo desde já que não estou interessada em fazê-lo, já passaram meses, eu voltei à minha vida normal, finalmente, não estou interessada em fazer ressurgir problemas, como deve entender não tenho nada para falar.
- Você não, mas eu tenho. Antes de mais, já sei que anda muito próxima do meu namorado, o seu colega Ronaldo, ele não me disse nada, mas eu tenho facilidade em saber de coisas, principalmente quando me interessam. Existem várias vantagens de ser filha de gente importante, temos acesso a tudo, literalmente tudo, então nesta ilha, enfim, você sabe. Mas isso é o de menos, você falar com ele não me atinge muito, mas o teor das conversas já me preocupa.
- Que teor? Que tipo de conversa pode haver entre colegas? Trabalho, apenas.
- Não Anabela, você sabe que não. Mas eu também não pretendo aprofundar isso, eu vim aqui para lhe fazer um aviso.
- Um aviso? Isso é para tomar como algo negativo? Uma ameaça?
- É livre para entender como quiser. É um aviso bem simples de assimilar. Tenha muito cuidado com o que anda a tentar fazer, a tentar saber, mais cedo ou mais tarde, será descoberta, e tenho a plena certeza que você não sabe os problemas que isso vai acarretar para a sua vida. Tenha muito cuidado.
Disse aquilo, deu boa noite e foi embora. Perdi o sono, e a hora tardia já nem me importou muito, fiquei atordoada, com medo. Ela foi firme no que disse, ela sabe que estou a tentar descobrir mais coisas sobre a morte do pai dela. Mas afinal, ela veio ameaçar-me ou alertar-me? É a dúvida que permanece.

© Alexandra Carvalho

O SABOR DA MORTE (Parte 8)


Passaram alguns dias, não voltei a estar nem com o Pedro nem com o Ronaldo, a verdade, é que também não tive uma semana calma, não tive tempo para os procurar mas nenhum deles teve a iniciativa de o fazer.
O trabalho consome a maior parte do meu tempo, e os pequenos momentos livres que tenho é para descansar em silêncio, para ler, ver televisão ou navegar na internet.
Por outro lado, também não queria dar justificações ao Pedro, falar do meu colega, daquilo que conversamos e do que ficou para conversar. Sentia-me pressionada e cansada, deixei-me ficar quieta, na minha rotina diária. Em algum momento voltaria a falar com eles, mas não agora.
Já sabia que depois de ter decidido investigar por conta própria a morte do jornalista a minha vida iria mudar, mas provavelmente não pensei que fosse tanto, na minha ingenuidade nem tinha bem a noção de onde me estava a meter, que confrontos eu poderia vir a vivenciar. Eu sabia que o jornalista era famoso, sabia que era um meio que eu não conhecia bem. É verdade que eu fazia parte de um meio elitista, que conhecia muita gente na saúde e mesmo noutros ramos, mas os anatomistas patológicos não costumam ter um papel muito visível, fazemos parte do meio, mas somos facilmente obscurecidos perante os outros especialistas da saúde. Diga-se de passagem, que é muito mais bonito ser cardiologista, pneumologista, ou algo assim.
Já tinha passado por todo aquele processo de descrença no início de tudo isto, e foi difícil mas efectivamente, não pensei em nenhum momento que pudesse vir a ser ameaçada, mas fui.
Já era tarde, lembro-me de olhar para o relógio do computador e ter visto que já passava da meia-noite, não costumava ficar até tão tarde acordada e muito menos na internet, mas naquele dia tinha decidido tirar tempo para fazer pesquisa e surgiram documentos tão interessantes que me deixei ficar presa ao computador.
A campainha tocou, não a da porta de acesso ao prédio, mas a do meu apartamento, fiquei intrigada, quem é que me vem chatear àquela hora? Devia ser algum vizinho ou alguém do condomínio.
Não era nenhum rosto conhecido, pelo pouco que conseguia ver pelo olho da porta, era uma mulher, não me pareceu suspeito, e abri a porta.
- Boa noite, pela expressão de dúvida já percebi que não sabe quem sou, mas é muito fácil, Daniela Fonseca.

© Alexandra Carvalho

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Acaso

As tuas palavras

Ecoam nos meus ouvidos

Como se de sinos se tratassem…

A melodia conforta-me,

Traz algo especial aos meus dias.

Cá dentro, é como se te conhecesse,

Como se fosses um acaso do destino.

Sabendo ou não,

Tu disseste o que eu precisava ouvir.

Fizeste renascer a parte de mim

Que eu deliberadamente,

Deixara esquecida no passado.

domingo, 20 de novembro de 2011

O SABOR DA MORTE (Parte 7)

Talvez possa parecer estranho, mas quando Pedro tocou a campainha do meu apartamento, eu hesitei em abrir a porta. Via-o através do monitor do interfone, ele estava inquieto, um olhar preocupante, não sei o que teria para me dizer, eu é que não lhe queria contar nada sobre o meu dia.
Não abri a porta, mas nem é preciso dizer que em segundos o meu telemóvel estava a tocar, podia muito bem dizer que não estava em casa, ele não tinha como saber, não tinha acesso ao estacionamento, por outro lado, eu estava com vontade de mentir para o meu amigo de infância, e isso nunca tinha acontecido antes.
- Sim.
Tentei parecer o mais normal possível.
- Então Anabela, não estás em casa? Acabei mesmo de tocar na campainha do teu prédio, acabei por desistir, vim até ao café em baixo, está tudo bem?
Era mentira, ele continuava lá e dizia-me que estava no café, estávamos os dois a mentir, não sei bem porquê.
- Está tudo bem, não te preocupes, nem tenho dito nada, a investigação está em pausa, ando cheia de trabalho, sabes como é. Agora vim à casa do Fabrício, ele estava a precisar falar, anda novamente com problemas existenciais, aquelas coisas dele, sabes?
- Pois, esse homem passa a vida nisso, é como se a vida dele fosse a pior de todas, desilusões amorosas deviam passar rápido, mas ele deixa-se ficar nas recordações. Mas está bem, dá-lhe apoio, depois ligo mais tarde. Contas-me o que soubeste com o médico, o teu colega.
- Sim, sim, não te preocupes. Irei pôr-te ao corrente das novidades. Até logo. Beijo.
Desliguei, não me sentia bem, uma estranha sensação de desconforto apoderou-se de mim, eu menti descaradamente ao Pedro, à única pessoa que seria incapaz de mentir, pelo menos, até hoje. E agora o Fabrício, tenho de o avisar deste episódio não vá o Pedro falar-lhe disto. De repente, a minha vida estava a tomar um caminho sinuoso, até onde isto irá.

© Alexandra Carvalho








sexta-feira, 18 de novembro de 2011

O SABOR DA MORTE (Parte 6)

- Anabela, nós já falamos há algum tempo, e cada vez tornamo-nos mais íntimos, até agora ainda não percebi o que te impulsionou a isso. Sempre fui fechado, não é novidade, sei bem o que o pessoal diz por aí, então resta-me uma pergunta, qual é o teu interesse?
Naquele momento o chão fugiu-me dos pés, mas que resposta plausível conseguirei inventar tão rápido, ou direi a verdade, correndo o risco de acabar com qualquer ponta de esperança em descobrir alguma coisa. Não me ocorreu mais nada, senão, desconversar.
- Interesse?! Mas que tipo de interesse poderia eu ter em ti? Segundo me consta somos colegas, não vejo nada de estranho nisso, mas porquê, tu vês?
- Vejo, completamente. Não sou do tipo de ter amiguinhos entre os colegas de trabalho. Basta olhar à volta, e ver que tipo de relação tenho com os colaboradores do hospital. Então, sim, vejo algo de muito estranho nisto.
- Não tens amiguinhos, mas provavelmente por isso, deixaste que eu te abordasse. Já pensaste nisso?
- E era sobre isso que estávamos a falar? Se achas que o teu poder de desconversar é assim tão magnífico, enganas-te, redondamente.
- Mas afinal, achas que posso estar a querer seduzir-te! É isso?
- Seduzir, não. És demasiado inteligente e coerente para o fazer. Sabes que tenho namorada, sabes que jamais me envolveria com alguém do meu núcleo profissional. Há um interesse qualquer, já me passou algumas ideias pela cabeça, mas ainda não tive vontade de explorar isso.
Mas que ideias é que lhe passaram pela cabeça, será possível que esteja a desconfiar da verdade. Ele é antissocial mas não é desatento.
- Anabela Fontes, não sou otário, nem vou fingir que sou, só para facilitar a tua vida.
- Como assim? Não tenho a certeza se consegui perceber onde queres chegar.
- Simples, acho que é óbvio e ambos concordaremos nisso, tu sabes com quem namoro, ainda mais óbvio que saibas quem era o pai dela, e concordaremos certamente nisto também, tu fizeste a autópsia do Tiago, na altura em que ele morreu. Agora, ainda mais simples é, tu foste desacreditada na época, por causa do teu resultado na autópsia, para além disso, houve a necessidade de fazer nova autópsia pelos médicos da clínica que a família dele frequenta. Precisas de mais?
- Hummm, mas achas que eu me aproximei para tentar saber coisas sobre essa decisão de fazer nova autópsia?
- Claro que não, tu aproximaste-te porque sabes que ele não teve um ataque cardíaco, ele foi assassinado, e estás revoltada porque ninguém investigou este homicídio.
Sim, agora faltaram-me as palavras e os argumentos também. E tenho a certeza que ele percebeu isso. Terei aqui um aliado, ou um suspeito?
- Essa é uma informação com rasteira? Ou devo comentar isso? Estou à deriva.
- Desde o início que percebi que a tua aproximação, devia-se a esse facto. Deixei passar, porque tu és uma colega simpática e interessante, para além de que concordo contigo, pelo menos até um certo ponto. Não sei se te posso ajudar, estou demasiado envolvido naquela família, mas a verdade, é que também não sei assim tantas coisas. Eu sou o namorado da filha, não o marido, e aí está uma diferença abismal, no que toca a informações privilegiadas.
- Acho que agora não vale a pena continuar a farsa, acertaste no ponto. Agora a minha carreira está mais equilibrada, mas naquela época, as coisas não foram fáceis, nada mesmo.
Senti que podia confiar nele, a sua transparência e clareza demonstravam a sua honestidade e carácter. Não valia a pena continuar a mentir.
- Tens razão, está na altura de falar, de tentar explicar o porquê de ter travado conversa contigo naquele dia. Mas não quero que isso afecte o relacionamento que temos, agora. Acredites ou não, comecei a gostar de ti. És um bom colega.
- Um bom colega, bem, talvez isso seja exagero. Não sou muito sociável, por opção, este hospital é pequeno demais para que possamos criar amizades, há muitas conversas paralelas, e eu nunca gostei disso. Irritam-me.
- Tens razão, as instituições são como os locais, pelo meio há sempre conversas paralelas, comentários mesquinhos, nem sempre apetece interagir com esse determinado tipo de pessoas.
Por destino ou não, a verdade é que surgiu ali um entendimento maior do que estávamos à espera, penso que surgiu logo no início. A química não se explica, sente-se e aproveita-se.
E quando a nossa conversa iria finalmente se desenrolar, aparece do nada uma enfermeira toda apressada a chamar pelo Dr. Ronaldo Figueiredo, é claro que ficamos por ali, mas inevitavelmente voltaríamos a conversar.

© Alexandra Carvalho






















quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O SABOR DA MORTE (Parte 5)

O Ronaldo é um ser humano confuso, não se trata de maneira nenhuma de um médico popular, em que os utentes encontram na rua e abordam, pelo contrário, mantém uma postura fechada, não socializa dentro do Hospital nem na Clínica onde trabalha a tempo parcial.
É um bom médico dentro da sua especialidade, neurocirurgia. A Ilha da Madeira é pequena, então torna-se fácil detectar os bons médicos em cada especialidade, uma vez que são praticamente uma minoria.
Diz-se entre os utentes que até nas consultas ele mantém-se demasiado sério, focaliza-se apenas nas questões centrais, que interessam no estado do paciente e não permite extravasar para outros temas que não lhe digam respeito.
Tive sorte, porque nesse mesmo dia encontrei-o num dos corredores do hospital, e por mais estranho que pareça, sorriu, um leve cumprimento, mas sim, sorriu.
Não foi de todo complicado travar conversa com ele, talvez entre colegas, o círculo de socialização não fosse tão fechado. Falamos de assuntos do hospital, a falta de pessoal que por vezes é visível, médicos em especial. E isto manteve-se alguns dias, em encontros casuais, no bar do hospital ou até mesmo no café ali perto, onde muitas vezes, a equipa médica vai, naquela necessidade de sair do espaço durante os períodos de lanche, ou simplesmente para tomar café, algo que acontece com pouca frequência, não há tempo que sobre num hospital.
Nunca demonstrei interesse em demasia para que o meu colega não percebesse que queria dele muito mais do que simples conversas. Mas a verdade é que em algum momento fui transparente e em pouco tempo a conversa que eu procurava simplesmente surgiu.

© Alexandra Carvalho

terça-feira, 15 de novembro de 2011

O SABOR DA MORTE (Parte 4)

Quando se mantém uma amizade de uma vida inteira, muitas palavras deixam de ser ditas, porque apenas um olhar revela o nosso estado emocional, a nossa essência mostra-se a quem nos quer bem e a quem nós queremos bem. E entre Anabela e Pedro existia esse tipo de amizade, estranhamente, muitas palavras deixaram de ser ditas, e algumas delas não foram reveladas com o simples olhar, mas isso, ainda é muito cedo para abordar.
Pedro é o tipo de homem galã, movimenta-se muito bem em todos os círculos sociais, tem amigos em todo o lado, muitos devem-lhe favores e ele aproveita-se disso de vez em quando, mas só mesmo de vez em quando.
Não assume relacionamentos sérios, não tem interesse, pelo menos é o que diz, tem a seu favor a beleza e o charme típicos de um galanteador, aventuras amorosas é coisa que não lhe falta. Bem, admito que a sua profissão também lhe confere algo extra, as mulheres acham piada a profissões de risco.
Conhecemo-nos há imenso tempo, quase que perdi a conta dos anos. Crescemos juntos, colegas desde o ensino básico ao ensino secundário, eu grande aluna, ele, assim-assim, como ele próprio diz. A verdade é que conseguimos manter ao longo dos anos a mesma amizade, aquele tipo de amizade que cresce à medida que nós crescemos também, como homens e mulheres.
Os dias passam e tenho a estranha sensação que pouco avança esta investigação, é como se tudo estivesse na mesma, como se houvesse um bloqueio que não me permitisse descobrir nada e o Pedro, por mais técnica que tenha e experiência na área também não está a avançar nas informações.
O melhor caminho a seguir provavelmente será pela filha, a Daniela ou até mesmo pelo namorado, o Ronaldo, é médico, para mim não será tão complicado chegar até ele.

© Alexandra Carvalho

O SABOR DA MORTE (Parte 3)

Antes de chegar à sala do Pedro, tenho de percorrer um corredor enorme com imensos gabinetes, passei-os todos e bati à porta.
- Entre – disse Pedro com a sua tão característica voz rouca e baixa.
- Olá, sou eu! Tens tempo para mim? São só uns minutos! Sim?
- Claro que sim, Anabela. Arranjo sempre tempo para ti. Mas diz lá, para te deslocares até ao meu escritório deve ser mesmo muito importante, detestas cá vir…!
- Pois é, e nem sei muito bem como começar, prepara-te!
- Vá, fala.
- Ouviste falar com certeza na morte do jornalista Tiago Fonseca?!
- Então não ouvi! Apareceu em todos os jornais e em todos os canais de televisão, para não falar do rebuliço que houve cá dentro! Uma morte estranha, digo eu!
- Também achas estranha?
- Sim, aquele ataque de coração não me convenceu minimamente. O homem era muito cuidadoso com a sua saúde e além do mais, horas depois da sua morte, um médico afirmou que aquilo era impossível, porque ele nunca teve problemas de coração, ou seja, tinha saúde para dar e vender! Contudo, ainda não acaba aí, porque com o desenrolar, tudo parou, e o médico surge novamente a dizer que era possível ter-se enganado, contraditório não?! Eu sou sincero, não me convenci, de qualquer forma não posso fazer nada, foi encerrado o caso, a família não insistiu… e esse também, quer dizer que partilhas da mesma opinião?!
- Exactamente, mas há um pormenor que desconheces, o corpo quando foi retirado da casa foi para o hospital, que é onde eu trabalho, imagina quem…
- Já percebi, foste tu quem fez a autópsia, e o que encontraste no corpo?
- Vou directa ao assunto, ele tinha vestígios de um veneno que provoca ataque cardíaco. É através de uma injecção e normalmente não dá para perceber que foi aplicada, mas neste caso deu, ainda mais porque ele tinha o braço ligeiramente marcado, deve ter tentado fugir mas não conseguiu. Enfim, é isto, tenho o resultado da autópsia comigo, é uma evidência. De seguida, aconteceu uma série de situações que provaram a minha desconfiança. Pedro, eu sei que é loucura, mas quero descobrir a verdade. Aconselha-me!
- Bem… é aliciante, até eu gostava de saber a verdade, mas é arriscado, mexe com gente importante.
- Achas que não sei que é arriscado?! Entende o meu lado, as pessoas deixaram de acreditar na minha capacidade como anatomista patológica, não leste os jornais, não viste televisão?!
- Não fazia ideia que eras tu, não mencionavam nomes, nunca vi a tua fotografia em lado nenhum, se soubesse talvez tivesse agido na altura.
- Não posso continuar assim, a minha vida desmoronou a partir deste caso. Eu tenho a certeza do que analisei, mas a família fez questão em me desmentir arranjando outro anatomista, provavelmente comprado ou chantageado, sei lá, mas também não interessa!
- Enganas-te, interessa muito. Se o médico foi chantageado, já temos uma ponta solta, torna-se mais fácil obter dados.
- Temos?!
- Já entrei no caso e podes ter a certeza que vou até ao fim.

© Alexandra Carvalho

O SABOR DA MORTE (Parte 2)

Eram três horas da tarde, tudo estava calmo. Tinham passado dois meses desde a morte do jornalista. Ninguém tinha chegado a nenhuma conclusão, uma única pista que fizesse perceber aquela morte. Por mais incrível que pareça, a família de Tiago, perguntava-se constantemente porque apenas eu achava que ele tinha sido assassinado e não tinha sido vítima de ataque cardíaco, como constava no relatório da autópsia da sua clínica. Porém, é fácil responder a essa pergunta, fui eu a pessoa que lhe fez a primeira autópsia e aquilo que constatei não foi um mero ataque cardíaco, próprio da idade de Tiago, 70 anos, mas sim algo que lhe foi aplicado forçosamente para ter esse efeito. Como é óbvio, ao saber da diferença de relatório entrei em contacto com a clínica que fez a segunda autópsia, e tornou-se curioso este caso, porque me vetaram a entrada e principalmente o acesso aos dados da análise.
Passados estes dois meses, tomei uma decisão. Não me vou calar mais, pretendo descobrir a verdade e fazer justiça por aquele homem que já não se encontra entre nós, por vontade de alguém, ou porque a sua presença não estava a agradar ou então porque já era hora de passar a fama a outra pessoa, nomeadamente, à sua única filha, Daniela, a sucessora naquele mundo de riqueza e fama.
São dez horas da manhã, é o meu primeiro dia como detective. Admito sem embaraço algum, que não é o meu forte, mas como o que está em causa é um motivo de força maior, vou deixar de lado o meu espírito pacato e conformista e começar a dar acção à minha vida. Acho que Tiago merece o meu esforço e dedicação, não que eu tenha tido algum tipo de relação com ele no passado, apenas acho que qualquer pessoa merece justiça, independentemente de estar viva ou morta. Claro está, também para mostrar que estava correcta na minha análise.
Não sei muito bem como começar mas como os amigos existem e podemos sempre recorrer a eles, estou com sorte, o meu melhor amigo é da polícia judiciária e com o apoio dele tudo será mais fácil.

© Alexandra Carvalho


O SABOR DA MORTE (Parte 1)

Não sei ao certo qual a data, qual a hora da sua morte, sei apenas que Tiago Fonseca não morreu por morte natural mas sim por homicídio. Apesar de afirmar com toda a determinação este facto, não sou testemunha, nem tão pouco fui eu a ver primeiro o cadáver estendido na sala da casa onde vivia.
Ele vivia só, tinha poucos amigos e bastantes inimigos, mas seriam eles capazes de cometer tal crime? Não me parece!
Tiago era jornalista, um famoso jornalista, possuía alguns empreendimentos de comunicação social na ilha onde havia nascido, a Madeira, nomeadamente rádios, jornais e uma data de revistas de carácter geral e específico, diga-se de passagem que era um homem bem-sucedido na vida, conhecido entre os vários estratos sociais, o que não é de todo difícil, porque a Madeira é uma ilha pequena.
Já há alguns anos que não exercia a sua profissão, os seus empreendimentos ocupavam a maior parte do seu tempo, acabou por deixar de lado o jornalismo, agora era talvez, empresário, sei lá, qualquer coisa de importante. Os inimigos que tinha eram do mesmo ramo, logo, a inimizade existente era pura e simplesmente por causa de vendas e audiências, não acredito que algum deles fosse capaz de matar por isso, até porque a maior parte destes rivais tinham dignidade e inteligência suficientes para não cometer tal estupidez. Tiago fazia parte de uma classe social alta, assassiná-lo era sinónimo de escândalo e investigação.
Este homicídio tem muito a desvendar, provavelmente o assassino é alguém que ninguém põe em causa. Eu também não sei, nem vou fazer nada para descobrir. A polícia existe, os detectives privados também, que façam o seu trabalho e um dia saberão quem matou Tiago Fonseca, o rei madeirense da comunicação social.

© Alexandra Carvalho



quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Apenas sonhos e algumas decepções

Acabei por andar mais ausente das minhas publicações porque fui apanhada por uma gripe própria desta altura, num dia adormecemos bem e no outro, a cabeça está à roda, os olhos a arder, e a garganta a incomodar imenso.
Mesmo sem querer, uma simples gripe deixa-nos mais vulneráveis, sentia-me tão mal, que até deixei cair algumas lágrimas, o ser humano no auge da fraqueza sempre acaba por chorar, e eu, diga-se desde já, que não tenho dificuldade em chorar.
Nestes momentos pensamos em muita coisa, na vida que temos, no que não temos, no que queríamos ter, apercebi-me que a minha percentagem é mais elevada naquilo que não tenho, do que aquilo que tenho. Não sou materialista, e nem é disso que se trata, falo dos sonhos, daquilo que gostava de estar a fazer,  daqueles sonhos que crescem connosco, que criam asas dentro da nossa imaginação, da nossa mente e também do nosso coração.
A verdade é que nem todos os sonhos se realizam, nem mesmo aqueles que achávamos à partida fáceis de realizar, como trabalhar na sua área de formação.
Portugal foi caminhando a passos largos para o abismo, e quando achei que estaria prestes a realizar esse sonho, o país apercebe-se que afinal, já caiu no abismo, e muitos sonhos não poderão ser concretizados.
O planeta Terra é enorme, há sempre escolha, há sempre um cantinho que talvez nos dê a oportunidade de fazer o que nós gostamos, de sermos quem verdadeiramente somos, um lugar que não nos corte as asas, nem dos nossos sonhos nem do caminho que queremos percorrer.

© Alexandra Carvalho

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Em diagnósticos

Esta é uma daquelas noites em que me apetece ir para o computador e escrever, ou no livro que ando a fazer ou algum tipo de crónica ou desabafo, mas a verdade é que não o posso fazer. O meu computador avariou vai fazer um mês e por mais incrível que pareça continua em fase de diagnóstico. Este é o nosso país, tudo muito devagarinho, este é o ritmo de trabalho mais frequente, dá tempo, o cliente não tem pressa!
Confesso, estou a entrar num estado que não me agrada muito, um mês para fazer diagnósticos? Para mim, ultrapassa o razoável. E eu como sou uma cliente exigente e pro-activa, é  óbvio que já tiveram que levar com os meus telefonemas e até com uma visitinha minha, não resultou, "sabe, ainda não tivemos tempo de mexer nele", surreal, será mesmo falta de tempo ou falta de empenho, de dinamismo?
Bem, o certo é que já não sabia o que era viver sem computador, é o degredo, é um condicionalismo enorme. Apesar da televisão existir há muito mais tempo, e por mais estranho que possa parecer, eu consigo viver sem televisão, mas se me tiram o computador e a Internet os meus dias tornam-se bem mais cinzentos e irritantes.
Amanhã estou eu a telefonar de novo.

© Alexandra Carvalho

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Aceitação


Eleva-te das sombras,
Encontra a luz que já possuis,
Esquece o medo e a dúvida,
A vida é mais colorida
E muito mais luminosa
Do que o teu coração perdido
Te permite ver…
Depois de um caminho fechado,
Há sempre um trilho que se mostra,
Percorre-o sem medo,
O fácil nunca é mau,
É a vida a te sorrir…
Mas não te esqueças
Que todos os dias deves crescer,
Deves evoluir e perceber quem és.
Os caminhos complicados
Não são castigos, é o teu destino,
Escolheste-os mesmo sem saber.
O teu coração perdido
Escolheu o que queria viver;
O que queria sentir…
Encontra a tua luz
E aceita as escolhas da tua vida,
São elas que te farão percorrer
O teu verdadeiro destino.