terça-feira, 20 de novembro de 2012

A história de Alexandrina


Esta é a história sobre a jovem Alexandrina, a doce menina que São Vicente viu nascer.
Poderia ser a história de qualquer menina daquela época, já que em 1918, o futuro das mulheres era semelhante entre elas. Mas, não recordaremos mais nenhum passado, além do de Alexandrina.
Agora, olhando ao nosso redor e a todo este desenvolvimento que o Norte presenciou e viveu, torna-se difícil, visualizar uma época mais remota, em que as classes sociais eram demasiadamente vincadas e reconhecíveis.
Os pobres e os ricos. Os que trabalhavam as terras e os que eram os seus donos. Não existia, aquela classe média, que nos habituamos a ver nos nossos dias, e que por infortúnio, estamos a ver desaparecer aos poucos, de um Portugal que se diz desenvolvido.
Ah, antes que se percam nos factos, estamos no ano de 2012.
Não, não se trata de todo, de mais uma história sobre uma qualquer menina pobre que se diferencia e dá azo, a um certo tipo de romance associado à pobreza.
Alexandrina não era pobre, pertencia a uma família tradicional rica, da cidade do Funchal.
Como a maioria das famílias afortunadas e abastadas, esta família possuía vários terrenos no Norte da Ilha da Madeira. Terrenos cultivados por gentes de confiança da terra.
Porém, até aqui, nada de novo.
Mas Alexandrina, trazia consigo muito mais do que sangue nobre.
E a partir daqui, começa a verdadeira história.
Em 1918, ainda eram comuns os casamentos arranjados pelos pais, e esta tradição manteve-se por várias décadas posteriores.
Amor, não era uma palavra muito utilizada na época, os poetas eram os únicos que amavam desmesuradamente, talvez por nascerem dotados de uma profundidade e sensibilidade atípicas, aos restantes mortais. A verdade, é que a maioria pouco sabia sobre o amor.
E se na cidade esta tradição de casamento contratual ainda era vigente, nas aldeias era muito pior.
Um bom ou mau casamento significava, prosperidade ou ruína.
Previsivelmente, todos os pais almejavam um bom casamento, ou melhor, um bom contrato financeiro.
Alexandrina, não era uma excepção, já nascera com um casamento arranjado, com um filho de outra família nobre, uma família nortenha nobre, e é neste casamento que reside todo o drama da história de Alexandrina.
O secretismo das relações extra conjugais era extremo, ainda que muitas esposas tivessem conhecimento das traições, muitas vezes, no seu próprio lar com as empregadas.
Não era novidade, mas mantinha-se em segredo, como se amenizasse a humilhação das esposas.
Alexandrina não tinha apenas sangue nobre a correr nas suas veias, era filha de um Senhor com uma empregada, diga-se desde já, que ele nem fazia ideia desse feito.
Os pobres não tinham uma vida fácil, e o medo de perder o trabalho era imenso, a fome assustava, bem, assusta qualquer ser humano, em qualquer tempo.
Como é de prever, não existia à época, um sistema de adopção como o que existe agora.
A solução daquela empregada só podia ser uma, esconder a gravidez e dar aquela criança. O que não era assim tão difícil, muitos casais da nobreza eram vítimas da desfortuna de não poder ter filhos.
Alexandrina, encontrou facilmente uma família e um lar, que a acolheu condignamente. Como legítima herdeira.
Não se esqueçam, Alexandrina tinha como pai biológico, um Senhor da Nobreza, antes fosse, uma simples plebeia.
A mãe morrera cedo, apanhou tuberculose. A única pessoa que sabia a verdade.
Alexandrina estava prometida a um belo jovem nortenho. E tal, não era sacrifício, pois o que Eduardo tinha de beleza também tinha de carisma e bom carácter. O amor nasceu bem cedo entre eles, entre todos os olhares trocados.
Mas o sangue era o mesmo, Alexandrina era meia-irmã de Eduardo. E essa verdade, ninguém a conhecia.
A moral da nossa sociedade diz, desde sempre, que irmãos não podem ter nada um com o outro, mas estes dois irmãos não se conheciam dessa forma. Seria pecado na mesma? Ah, tomara o mal fosse apenas o pecado, infelizmente não era o pior dos males.
Estes dois desconhecidos irmãos casaram e não tardou que tivessem filhos, um atrás do outro, nasceram com deficiências, físicas, mentais. E a infelicidade e desventura, apoderaram-se daquele jovem casal, por muitos invejado, pela beleza e amor visíveis.
A pergunta que restava, que pecados teriam eles cometido, para ter uma sina tão triste?
Afinal, o pecado não era deles, o pecado da traição existira no passado, o secretismo, o puritanismo acabara por destruir as gerações vindouras.
Não será novidade, se contar que Alexandrina com o passar dos anos, e das tentativas falhadas de ter um filho sem deficiências, embora amasse a todos, acabou por enlouquecer.
O casamento que jamais deveria ter acontecido, acabara na mesma, a vida encarregou-se disso.
O sangue que o casal partilhava, havia causado toda aquela desgraça.
Alexandrina enlouqueceu, Eduardo casou novamente.
E a verdade jamais se soube.
Esta foi a história trágica de Alexandrina.

© Alexandra Carvalho


3 comentários:

  1. em forma de conto, uma estória que acho ser verídica muito interessante.
    deixou-me com um aperto no peito.
    obrigada por a ter divulgado.
    um beijo

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  2. Triste mas que espelha uma realidade não muito longínqua.
    Não sei se é verdadeira ou não, mas pode bem ser.
    Gostei muito.

    Bjinhos

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  3. Cem anos de solidão. Tens de ler. Bjo

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