Sim, o Arraial do Bom Jesus irá sempre remeter-me para lembranças antigas.
Dos tempos em que acordava eufórica para ver se já havia mais barracas pelas ruas circundantes à minha casa.
O cheirinho a louro das traves colocadas simetricamente. As flores, que ajudávamos a pôr. O interesse era vê-las lá a embelezar o nosso sítio. E ajudávamos como sabíamos. Éramos crianças, adolescentes.
Mas o Arraial não era apenas isso. Era reencontro. Era família.
A família emigrada chegava sempre dias antes. A avó Piedade ainda estava por cá. O Sr. José também e havia ali, em todos, uma energia diferente do resto do ano. Falavam sobre os bolos a fazer, o pão a amassar. Quem vinha para almoçar connosco, se as tias do Funchal também vinham, o meu avô Ricardo. Era uma azáfama que me agradava.
Subia ao balcão da casa da minha avó, e olhava. Ficava parada tempos, perdia-me ali. Não sei bem o que via. Apenas olhava para tudo.
Hoje, quando penso no Arraial, o sentimento também é de saudade. Inquestionavelmente penso sempre, passe o tempo que passar na minha avó Alaíde. No calor que eu sentia que vinha dela, percebo agora, que esse calor ou conforto era amor.
Não sei passar o Arraial sem ir a uma barraquinha e comprar os doces de leite, não pelos doces. Mas por ela. Não para a prender a este plano, apenas para reafirmar que as almas que se amam, amam para sempre.
E aquela criança que perdeu a avó cedo, relembra os doces que ela fazia questão em trazer. É quase um sinónimo de amor.
A família tornou-se pequena. Com o tempo, fomos diminuindo no número, mas não no Amor.
Este Arraial do Bom Jesus, para mim, para além dos romeiros que atrai, para além de toda uma dinâmica que muda na minha freguesia, para além da fé ou da Religião. Este Arraial relembra que estamos juntos, e que enquanto houver amor, haverá tudo o resto.
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